quarta-feira, 28 de abril de 2021

'Não queremos afundar com o Mercosul', diz secretário de Comércio Exterior.

Estadão

“O Mercosul está afundando e nós não queremos afundar junto”, disse ao Estadão/Broadcast o secretário especial de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Roberto Fendt.

Em entrevista dada um dia depois de reunião de ministros do bloco – que terminou sem acordo e incluiu trocas de farpas entre Brasil e Argentina – Fendt disse que os brasileiros vão “fincar o pé” nas duas propostas apresentadas: redução da tarifa externa comum (TEC) e possibilidade de negociar acordos comerciais sem depender do Mercosul. 

Na entrevista, Fendt ponderou, porém, que ainda vale a pena para o Brasil fazer parte do Mercosul e que governo não cogita “Brexit” brasileiro. “Um Mercosul modernizado vai nos dar muito mais força do que temos hoje”, afirmou.  

O secretário disse ainda que o governo não pretende reduzir mais tarifas sobre bens de capital e informática, que foram cortadas em 10% em março. No dia em que a saída de vários secretários do Ministério da Economia foi noticiada, Fendt disse que “enfaticamente” não está deixando o governo e negou que haja uma debandada na pasta de Paulo Guedes. Abaixo, trechos da entrevista.

Houve relatos de trocas de farpas entre Brasil e Argentina na reunião de ministros na segunda-feira. Como foi essa reunião?

Foi uma reunião extremamente importante para cada país colocar na mesa o que entende em relação à modernização do Mercosul. Nossa posição, que o ministro [da Economia, Paulo Guedes] com serenidade, mas de maneira assertiva, colocou, é que queremos rebaixar a tarifa externa comum (TEC) e poder negociar unilateralmente acordos. Estamos dispostos a que cada país escolha se e quando [aderir às propostas de mudança]. Nós vamos fincar pé nisso, não vamos abrir mão. Como não estávamos chegando a um consenso, marcamos para a segunda quinzena de maio nova reunião.

Pelo que o senhor fala, o Brasil quer liberdade do Mercosul para tocar sua própria política? 

É isso mesmo. Não só o Brasil, o Uruguai também. Queremos sair do imobilismo que a gente está. O Mercosul está afundando, nós não queremos que o Mercosul afunde. Se o Mercosul quer afundar, nós não queremos afundar junto.

Qual a proposta brasileira?

A proposta do Brasil é reduzir em 10% a TEC de imediato e ter uma segunda redução de 10% em dezembro. Isso é um movimento pequeno. A Argentina colocou na mesa uma proposta de reduzir em 10,5% a TEC, mas de forma seletiva, não incidiria sobre todos os itens, como quer o Brasil. Nós não queremos escolher setores. A segunda perna da nossa proposta é a possibilidade de os membros negociarem acordos unilateralmente com outros países. Isso é importante porque nossas estruturas de produção são diferentes, pode ser que um país queira negociar acordos de livre comércio e outros não queiram.

E como os outros países veem a proposta?

O Uruguai apoiou integralmente a proposta brasileira. O Paraguai disse que concordava com 96%, deixando de fora 4% dos produtos, o que é perfeitamente aceitável porque são produtos sensíveis para eles. E disse que não seria favorável a cada país poder negociar acordo em separado. A Argentina disse que não eram favoráveis [aos dois pontos] e pronto.

A Argentina ficou isolada?

Não é que a Argentina foi isolada, a Argentina isolou-se. Guedes repetidamente mencionou que nossa posição não é contra a Argentina, é de modernização do Mercosul, que vai beneficiar todos os sócios. Nós reconhecemos que é um direito deles fazerem o que bem entenderem. Mas a Argentina bateu na tecla de que o acordo do Mercosul exige consenso. Consenso não é mandamento da lei de Deus, temos que ter capacidade de acompanhar o mundo.

Ainda vale a pena para o Brasil fazer parte do Mercosul?

Vale a pena sim. O Mercosul modernizado é um instrumento de negociação com outros países. Juntos, temos massa crítica. 

Não estamos falando de um Brexit [como ficou conhecida a saída do Reino Unido da União Europeia] brasileiro então?

Não, de jeito nenhum. Todos os ministros insistiram que essas propostas não visam pôr fim ao Mercosul, pelo contrário. Nossa ideia é de que um Mercosul modernizado vai nos dar muito mais força do que temos hoje.  

Que instrumento de pressão o Brasil tem caso a Argentina não aceite as mudanças?  O Brasil pode retaliar o país vizinho?

Retaliar a Argentina em hipótese alguma. O Brasil não vai pressionar a Argentina com nenhum instrumento. O Brasil está pela razão, pedindo a Argentina que nos acompanhe porque estamos claramente convictos de que isso será bom para os quatro membros do Mercosul. Não temos como forçar um país soberano com nenhum instrumento a mudar sua política econômica. Daí a nossa ideia de que cada país do Mercosul conceda aos outros três o direito de reduzir a TEC e se quiser negociar acordos sozinho, possa fazê-lo.

A intenção de negociar acordos bilateralmente é pensando em um acordo com livre comércio com os EUA?

Pode ser com qualquer país. Hoje nós não temos tratativas de acordo de livre comércio com os EUA. Já demos alguns passos importantes, firmamos recentemente um anexo de facilitação de comércio e um anexo de adesão a boas normas regulatórias. Isso vai criando um embrião para, quem sabe, mais na frente, se chegar à conclusão de que vale a pena algum tipo de acordo comercial com eles.

O setor privado reagiu mal à redução de tarifas sobre bens de informática e capital e geralmente reage assim a qualquer notícia de abertura. Isso não pode ser um empecilho para as negociações com o Mercosul?

O que aconteceu foi que, como foi marcada uma reunião extraordinária de presidentes do Mercosul em março, tivemos que reduzir as tarifas sobre bens de informática e capital a toque de caixa porque queríamos dar uma sinalização [antes da reunião]. Muitos dirigentes de associações ficaram muito aborrecidos e reclamaram com o ministro. E me disseram que, se tivesse feito isso para todos os setores, seria melhor. É o que queremos [com a redução da TEC], vamos com isso atender uma solicitação da indústria.

Pode haver mais medidas de abertura comercial sem depender do Mercosul?

Hoje não podemos fazer mais nada e não pretendemos reduzir mais as tarifas sobre bens de capital e informática.

Há uma debandada no Ministério da Economia, com a saída de vários secretários, incluindo a sua adjunta [Yana Dumaresq].  O senhor pretende sair também?

Não, enfaticamente não. Primeiro lugar, não tem debandada no governo, isso não ocorreu e não está ocorrendo. A Yana desde que eu assumi já tinha manifestado interesse em seguir nova carreira, à qual desejo enorme sucesso. 

Volta e meia há boatos de que o Ministério da Economia pode ser desmembrado. Existe essa possibilidade? Poderia ser recriado o Ministério da Indústria e do Comércio Exterior?

Não tenho conhecimento, acho que quem pode responder essa pergunta é o presidente Jair Bolsonaro

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