JOÃO PEDRO MALAR* - O ESTADO DE S.PAULO
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Ao ser lançada em 2019 a série The Boys trouxe um tema que não é necessariamente novo: mostrar de forma realista o que aconteceria se super-heróis existissem em nossa sociedade. Mas a produção surpreendeu pela sua abordagem, e continua acertando na segunda temporada, que estreia nesta sexta-feira, 4, na Amazon Prime Video.
O segundo ano da série mostra o acirramento do embate entre dois grupos: de um lado estão Os Sete, formado por sete super-heróis que não são tão heróis assim e são empregados pela empresa Vought International. Do outro estão Os Garotos, ou Boys, em inglês, que foi se formando ao longo da primeira temporada e reúne anti-heróis que acabam tendo atitudes mais heroicas que os próprios super-heróis da produção.
Como mostrado no final da primeira temporada, Hughie Campbell (Jack Quaid), Mother's Milk (Laz Alonso), Frenchie (Tomer Capon) e a Fêmea (Karen Fukuhara) viraram criminosos, e agora precisam se esconder e atuar clandestinamente. Para piorar, o grupo começa a segunda temporada separado do seu líder, Billy Butcher (Karl Urban), que os abandonou no final da fase anterior.
É interessante ver que o grupo vai se tornando cada vez mais uma família conforme passam mais tempo juntos, desenvolvendo um grau de lealdade entre si que não passa mais, necessariamente, por Butcher. O destaque fica para a relação de Frenchie e da Fêmea, ou Kimiko, que já havia chamado atenção nos episódios divulgados no ano passado. Enquanto isso, vemos um Butcher perdido passar por altos e baixos após a grande revelação da temporada anterior.
Do outro lado estão os “heróis”, que estão bem longe do que imaginamos quando ouvimos o termo. Os Sete encontram-se ainda mais divididos, desconfiando uns dos outros, e têm que lidar com desfalques na equipe. Um dos grandes acertos de The Boys está na mensagem que o grupo passa: uma pessoa pode ter poderes e abusar deles, cometer assassinatos ou outros crimes, e mesmo assim ser vista como um herói pela sociedade.
No meio do conflito entre as duas equipes está o relacionamento entre Hughie e a heroína - uma das poucas que faz juz ao título - Starlight (Erin Moriarty). Ele acaba tendo que lidar com novos e antigos traumas e se adaptar a sua nova realidade, enquanto ela se distancia cada vez mais da imagem idealizada sobre heróis que tinha. A relação dos dois é interessante, mas o destaque é a progressiva perda de otimismo e esperança deles enquanto tentam derrubar Os Sete.
Novamente o líder dos Sete, Homelander (Antony Starr), é a grande estrela da produção. É por meio dele que a série apresenta uma abordagem interessante: ela não coloca nuances em um super-herói, ou o faz realizar ações erradas mas justificadas pelo seu objetivo. Homelander é mostrado claramente como um sociopata, capaz dos piores atos, fruto exatamente da sociedade que o glorifica.
O personagem também é beneficiado pela ótima atuação de Starr, que rouba a atenção do espectador com suas caras e olhares que dão muito mais medo e geram mais tensão que muitas cenas fortes. Na segunda temporada o Homelander tenta ganhar mais espaço no comando da sua equipe, mas acaba tendo que lidar com as consequências de suas ações, que criam uma dinâmica interessante para o “herói” e mostram que ele não é tão frio e calculista quanto tenta ser. Tudo isso se soma às tentativas - cômicas e tensas ao mesmo tempo, uma marca do personagem - de agir como pai, uma dinâmica revelada no final da primeira temporada.
Uma das grandes vantagens da temporada é que, por ser uma continuação, ela não precisa apresentar todo um universo novo e seus personagens. Partindo das bases da primeira temporada, há um aprofundamento dos personagens e enredo.
O espectador conhece mais do passado de Frenchie, Mother’s Milk, Kimiko, a Rainha Maeve (Dominique McElligott) e até dos três principais personagens: Hughie, Butcher e Homelander. Quase todo o elenco secundário ganha mais tempo de tela, uma mudança bem-vinda que enriquece a trama e nos faz ter mais afeição por algumas figuras.
As principais exceções ficam com os heróis The Deep (Chace Crawford) e A-Train (Jessie T. Usher). O segundo tem alguns bons momentos ao longo da nova temporada, mas acaba ficando um pouco apagado. Já o primeiro tem arcos secundários, que mantém sua função de alívio cômico - provavelmente uma referência a todas as piadas envolvendo o Aquaman, herói da DC Comics que claramente inspirou a produção - mas que não entretém muito e contribuem pouco para a série.
Um personagem, porém, segue sendo um mistério: Black Noir. O herói ganha mais tempo de tela, com ótimas cenas de ação e momentos cômicos, mas isso não traz um aprofundamento sobre quem ele é ou seu passado. No fim, isso acaba fazendo parte do seu “charme”, e até faz sentido caso os responsáveis pela produção sigam o enredo dos quadrinhos que inspiraram a série.
O personagem também é beneficiado pela ótima atuação de Starr, que rouba a atenção do espectador com suas caras e olhares que dão muito mais medo e geram mais tensão que muitas cenas fortes. Na segunda temporada o Homelander tenta ganhar mais espaço no comando da sua equipe, mas acaba tendo que lidar com as consequências de suas ações, que criam uma dinâmica interessante para o “herói” e mostram que ele não é tão frio e calculista quanto tenta ser. Tudo isso se soma às tentativas - cômicas e tensas ao mesmo tempo, uma marca do personagem - de agir como pai, uma dinâmica revelada no final da primeira temporada.
Uma das grandes vantagens da temporada é que, por ser uma continuação, ela não precisa apresentar todo um universo novo e seus personagens. Partindo das bases da primeira temporada, há um aprofundamento dos personagens e enredo.
O espectador conhece mais do passado de Frenchie, Mother’s Milk, Kimiko, a Rainha Maeve (Dominique McElligott) e até dos três principais personagens: Hughie, Butcher e Homelander. Quase todo o elenco secundário ganha mais tempo de tela, uma mudança bem-vinda que enriquece a trama e nos faz ter mais afeição por algumas figuras.
As principais exceções ficam com os heróis The Deep (Chace Crawford) e A-Train (Jessie T. Usher). O segundo tem alguns bons momentos ao longo da nova temporada, mas acaba ficando um pouco apagado. Já o primeiro tem arcos secundários, que mantém sua função de alívio cômico - provavelmente uma referência a todas as piadas envolvendo o Aquaman, herói da DC Comics que claramente inspirou a produção - mas que não entretém muito e contribuem pouco para a série.
Um personagem, porém, segue sendo um mistério: Black Noir. O herói ganha mais tempo de tela, com ótimas cenas de ação e momentos cômicos, mas isso não traz um aprofundamento sobre quem ele é ou seu passado. No fim, isso acaba fazendo parte do seu “charme”, e até faz sentido caso os responsáveis pela produção sigam o enredo dos quadrinhos que inspiraram a série.
E os fãs da história em quadrinhos The Boys, lançada entre 2006 e 2012, também vão ficar felizes por encontrar diversas referências, algumas mais sutis e outras mais explícitas, ao material original. Fica claro que a série cumpre bem a sua função de adaptação: ela consegue manter a essência do original, mas com atualizações e aprofundamentos.
Um dos personagens que melhor representa isso é a novata Stormfront (Aya Cash). A primeira mudança é que, diferente dos quadrinhos, a heroína é uma mulher. Mas a mudança mais relevante é que a nova integrante dos Sete traz com mais força o universo das redes sociais para o mundo dos super-heróis.
Stormfront pode parecer menos assustadora que Homelander, mas consegue ser uma vilã mais fria e calculista, exatamente o que o herói tenta ser, o que gera uma mistura de raiva e inveja em Homelander que é bem explorada. Por meio da heroína é possível entender como os super-heróis podem se aproveitar das redes sociais, atuando quase como influenciadores. A personagem realmente coloca The Boys em 2020, mostrando memes, fakes news e todo o potencial de mobilização das redes.
A série também se moderniza nos temas que aborda. Além das já presentes críticas ao uso da religião e da força dos grandes conglomerados empresariais e seu potencial de destruição e manipulação, alguns episódios colocam em debate a forma como a sexualidade ainda é explorada economicamente por empresas, e traz temas como racismo, superioridade racial e xenofobia.
Além da nova heroína, a série também inclui em seu elenco um nome de peso, Giancarlo Esposito. O ator dá vida ao CEO da Vought International, Stan Edgar, e materializa os objetivos da empresa de lucrar em cima dos heróis, das esperanças e medos das pessoas, e de influenciar a opinião pública. Esposito mostra que o líder de uma empresa bilionária pode ser tão perigoso quanto um super-herói, com destaque para sua dinâmica com Homelander.
Todos esses elementos se unem em uma temporada que conseguiu superar a anterior. Mais madura, a produção apela menos para cenas hiper violentas, e cria um humor próprio que combina com o estilo da série. O enredo mantém elementos da primeira temporada, mas fica mais sombrio e tenso, com um mistério que é introduzido no começo da temporada mas é resolvido apenas em seu fim.
A produção segue cumprindo bem seu objetivo, entender o que aconteceria se nossa sociedade produzisse super-heróis que, no fim, refletiriam a própria sociedade. The Boys aposta que esses heróis acabariam mostrando, e sendo afetados, pelo que de pior existe nela: ganância, violência, superexposição, hipocrisia e abandono.
É uma abordagem mais pessimista até que outras produções parecidas, como Watchmen ou Justiceiro, pois coloca seus “heróis” não como vigilantes que operam à margem da lei, mas sim como os próprios símbolos e representantes de um sistema repleto de erros, e que trouxe um olhar novo para um setor que ainda é muito influenciado pelo sucesso do “modelo” Marvel, com um tom mais otimista, leve e esperançoso.
Acesse: www.jacksoncampos.com.br
Um dos personagens que melhor representa isso é a novata Stormfront (Aya Cash). A primeira mudança é que, diferente dos quadrinhos, a heroína é uma mulher. Mas a mudança mais relevante é que a nova integrante dos Sete traz com mais força o universo das redes sociais para o mundo dos super-heróis.
Stormfront pode parecer menos assustadora que Homelander, mas consegue ser uma vilã mais fria e calculista, exatamente o que o herói tenta ser, o que gera uma mistura de raiva e inveja em Homelander que é bem explorada. Por meio da heroína é possível entender como os super-heróis podem se aproveitar das redes sociais, atuando quase como influenciadores. A personagem realmente coloca The Boys em 2020, mostrando memes, fakes news e todo o potencial de mobilização das redes.
A série também se moderniza nos temas que aborda. Além das já presentes críticas ao uso da religião e da força dos grandes conglomerados empresariais e seu potencial de destruição e manipulação, alguns episódios colocam em debate a forma como a sexualidade ainda é explorada economicamente por empresas, e traz temas como racismo, superioridade racial e xenofobia.
Além da nova heroína, a série também inclui em seu elenco um nome de peso, Giancarlo Esposito. O ator dá vida ao CEO da Vought International, Stan Edgar, e materializa os objetivos da empresa de lucrar em cima dos heróis, das esperanças e medos das pessoas, e de influenciar a opinião pública. Esposito mostra que o líder de uma empresa bilionária pode ser tão perigoso quanto um super-herói, com destaque para sua dinâmica com Homelander.
Todos esses elementos se unem em uma temporada que conseguiu superar a anterior. Mais madura, a produção apela menos para cenas hiper violentas, e cria um humor próprio que combina com o estilo da série. O enredo mantém elementos da primeira temporada, mas fica mais sombrio e tenso, com um mistério que é introduzido no começo da temporada mas é resolvido apenas em seu fim.
A produção segue cumprindo bem seu objetivo, entender o que aconteceria se nossa sociedade produzisse super-heróis que, no fim, refletiriam a própria sociedade. The Boys aposta que esses heróis acabariam mostrando, e sendo afetados, pelo que de pior existe nela: ganância, violência, superexposição, hipocrisia e abandono.
É uma abordagem mais pessimista até que outras produções parecidas, como Watchmen ou Justiceiro, pois coloca seus “heróis” não como vigilantes que operam à margem da lei, mas sim como os próprios símbolos e representantes de um sistema repleto de erros, e que trouxe um olhar novo para um setor que ainda é muito influenciado pelo sucesso do “modelo” Marvel, com um tom mais otimista, leve e esperançoso.
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