“A nossa participação ainda é muito pequena, se considerarmos que o Brasil hoje é o 12º PIB do mundo. Tem muito espaço para crescer”, garantiu o presidente executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, na quarta-feira, 28 de abril, na abertura do 2º Encontro Nacional de Comércio Exterior de Serviços (Enaserv).
O evento, que teve tecnologia como tema principal, foi remoto, transmitido pelo YouTube, e contou com um público de mais de duas mil pessoas de todas as partes do Brasil e de outros 12 países, como Argentina, China, França, Espanha e Estados Unidos.
Para o presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC), José Roberto Tadros, o crescimento do setor de serviços até aqui foi, principalmente, resultado do investimento em novas tecnologias, e as empresas terão que explorar cada vez mais as oportunidades com a economia 4.0.
“Agora é o momento e a hora digital, que incrementam as relações comerciais de forma rápida e estimula a redução da burocracia, facilitando a integração comercial entre os povos”, atestou Tadros.
“Somos 99% das empresas do Brasil e no processo de encadeamento, muito da exportação, sobretudo, de manufaturados é feita pela micro e pequena empresa. Ela também exporta, mas é a cadeia da esteira da promoção e da cadeia de exportação”, afirmou o diretor-presidente do Sebrae, Carlos Melles, que lembrou ainda que o segmento gera mais de 55% dos empregos formais do país.
O secretário especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia, Roberto Fendt Junior, disse que é necessário promover a ampliação da atual rede de acordos para evitar a bitributação. Atualmente, a rede cobre o equivalente a 60% das exportações brasileiras e 55% das importações. Se negociados acordos com Alemanha, Estados Unidos e Reino Unido (que conjuntamente equivalem a 17% das exportações e 24% das importações), esses percentuais alcançariam 76% de cobertura para as exportações e 79% para as importações.
OCDE
O secretário defendeu que a mobilização do Brasil pela entrada na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) ajudará a ampliar as exportações brasileiras de serviços. A estratégia está ancorada em pilares como o combate às barreiras não tarifárias, a reforma da estrutura tarifária do comércio exterior brasileiro e a negociação de acordos internacionais.
“Cumprir com as diretrizes e códigos da OCDE, para além de ser requisito para acessão do país à organização, é também um impulso que ajuda o Brasil a mover sua economia na direção desejada. Todos os protocolos a que o Brasil está aderindo terão impactos transversais e devem provocar melhorias sistêmicas em toda a economia do país”, garantiu Fendt.
A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) apoiou quase 15 mil empresas ao longo do ano passado, 52% delas eram micro e pequenas empresas. Ao todo, a Apex-Brasil tem 51 projetos setoriais de escopos variados, desenhados especificamente para cada segmento, são a principal ferramenta de promoção comercial da Agência. Três desses projetos são voltados aos serviços de tecnologia, com orçamento total somado de mais de R$ 28 milhões.
O presidente Sérgio Ricardo Segovia Barbosa afirmou que atualmente a instituição apoia quase 400 empresas nacionais visando ao desenvolvimento de negócios globais para o setor de serviços, com resultados promissores de mais de U$ 600 milhões.
Setor privado
Uma das cinco oficinas de manutenção e revisão de motores aeronáuticos da GE no mundo, a Celma é hoje um dos maiores exportadores globais. Mas nem sempre foi assim. O presidente da companhia, Júlio César Talon, contou que em 2002, 38% da produção eram para o mercado internacional. A jornada de sucesso veio após um grande esforço: melhoraram o tempo de entrega e reduziram os custos em 77%. Só em 2011 começaram a montar motores novos no Brasil. O maior negócio da GE na América Latina completa sete décadas esse ano. Da carteira de clientes, 96% são do exterior – 50% dos Estados Unidos -, e o maior cliente é a Latam.
Na visão do vice-presidente do Setor Privado no Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), Jorge Arbache, há algo mais sofisticado do que as manufatureiras incorporarem serviços aos produtos ou venderem serviços como parte do que comercializam. Trata-se do advento de tecnologias de produção fortemente intensivas em tecnologias digitais – tais como robôs e impressoras 3D – e tecnologias digitais de gestão da operação, que permitiriam que as empresas pudessem produzir e coletar enormes quantidades de dados associados ao desenvolvimento, produção e comercialização. A servicificação e as tecnologias digitais andam de mãos dadas, segundo Arbache, e uma impulsiona a outra.
”A adoção de tecnologias avançadas não garante maior competitividade e participação de empresas e países nos mercados em razão da popularização do uso daquelas tecnologias. O que parece ser decisivo para impactar a competitividade e o crescimento econômico e empresarial é a capacidade de inovar, desenvolver e gerenciar aquelas tecnologias, bem como o destino que se dá às mesmas”, disse Arbache.
O fomento às exportações por meio da desoneração dos tributos nos serviços utilizados nos processos produtivos foi o tema da palestra da gerente de Diplomacia Empresarial e Competitividade do Comércio da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Constanza Negri Biasutti, apresentou um programa formulado pela entidade de redução dos tributos das importações e aquisições de serviços utilizados por exportadores de bens industriais. Pela proposta, haveria uma queda de 2% a 4,6% no custo monetário dos tributos PIS/COFINS, ISS e Cide-Remessas, o que representaria uma redução nos custos das exportações de bens de R$ 18 a R$ 41 bi. O programa seria compatível com as regras da OMC. Segundo Biasutti, a adoção da proposta da CNI pelo governo aumentaria a inserção internacional do Brasil no mercado global.
“A cada US$ 1 que o Brasil exporta em bens manufaturados, US$ 0,40 são de serviços”, disse o subsecretário de Operações de Comércio Exterior da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Renato Agostinho da Silva. Estudo de benchmarking internacional em Acordo de Cooperação Técnica entre o Ministério da Economia e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) mostra que 10 integrantes do G20 adotam desonerações a serviços no âmbito dos regimes de processamento de bens pesquisados, todos com tributação sobre valor agregado e ampla creditação e compensação.
Segundo Agostinho, o Ministério da Economia tem trabalhado em uma proposta envolvendo a extensão dos benefícios dos atuais regimes Drawback, RECOF e RECOF-ESPED a serviços importados ou adquiridos localmente para exportação de bens, a qual será objeto de debate com o setor privado. Ele lembrou que o país passa por uma dura realidade fiscal, especialmente por conta da pandemia. Mas garantiu que a ideia do Ministério da Economia é, gradualmente, reduzir o custo da aquisição de serviços e, com isso, aumentar a variedade e a qualidade dos serviços para o exportador alcançar maior competitividade.
Abrindo os trabalhos no período da tarde, o analista de Competitividade do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) Gustavo Reis Melo apresentou três cases de sucesso em exportação de serviços: Ana Pires, sócia da Softex, Antonio Fascio, da OrçaFascio e Leonardo Nogueira, da Prosperi.
A palestra do superintendente da Área de Inovação 2 da FINEP, Maurício Alves Syrio, apresentou os números do fomento à ciência, tecnologia e inovação. Nos últimos 10 anos, a Finep apoiou 3.500 projetos, aplicando mais de R$ 35 bilhões. A instituição apoia 8 das 10 empresas mais inovadoras do país, com linhas de crédito operadas de forma direta – para empresas com faturamento acima de R$ 16 milhões – e indireta – empresas com receita de até 90 milhões, em projetos de até 10 milhões. A abrangência da inovação pode ser empresarial, setorial, nacional ou mundial, não importa. Segundo Syrio, quanto mais inovador e mais arriscado o negócio, maiores são as condições de apoio.
Confinado em sua casa em Montevidéu, no Uruguai, por conta da pandemia da covid-19, o secretário geral da Associação Latinoamericana de Exportadores de Serviços (ALES) se percebeu pensando nos próximos 20 anos e decidiu desenvolver uma pesquisa sobre o futuro do setor de serviços, do qual é um dos maiores especialistas na América Latina. Javier Peña Capobianco entrevistou mais de 70 líderes globais e regionais e concluiu que a chave para o sucesso das empresas prestadoras de serviços está na interseção da tecnologia, dos modelos de negócios e, acima de tudo, do ser humano e seu meio ambiente. Empresas, em todos os segmentos, gerarão oferta cada vez mais intangível por meio de modelos sob demanda e soluções para maximizar a experiência do cliente.
A pesquisa do secretário geral da ALES mostra a tendência de trabalho colaborativo entre todos os atores do ecossistema – governos, empresas, sindicatos, academia e indivíduos. “As decisões sobre quais locais considerar serão cada vez mais flexíveis, incluindo não apenas países e cidades, mas também a nuvem, por meio de sourcing virtual. Portanto, é esperado um crescimento de multisourcing, aposta Capobianco, que lançará um livro sobre esse trabalho nas próximas semanas no Uruguai com o título (em tradução livre) A Nova Era de Serviços Globais.
Sobre as estatísticas do mercado, o subsecretário de Inteligência e Estatísticas de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Herlon Brandão, disse que a fonte primária das informações é o Banco Central, que compila os dados de exportação e importação de serviços para fins de balanços de pagamentos, seguindo a metodologia do FMI. “Existe um ecossistema de recomendações internacionais para estatísticas oficiais, tanto para comércio exterior, quanto para estatísticas nacionais”, afirma Brandão.
No mesmo painel, o coordenador de Acesso a Mercados da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Paulo Guerrero, explicou que a crescente servicificação da economia pode ser constatada quando vemos que o setor de serviços corresponde a 20% do comércio global. Segundo ele, as negociações internacionais de serviços criam regras justas e equitativas para o comércio de serviços entre as partes, reduzindo as barreiras enfrentadas por prestadores de serviços.
Agronegócios
No início da década de 70, o Brasil vivia uma situação de insegurança alimentar. Foi o que contou o presidente da Embrapa, Celso Luiz Moretti. As políticas públicas eram insuficientes para o desenvolvimento agrícola, mantendo a produção baixa e concentrada nas regiões sul e sudeste. O país era conhecido apenas como produtor de café e açúcar, sofria uma crise de abastecimento e pobreza rural, importando alimentos básicos, como leite, feijão e carne, dos Estados Unidos, México e países europeus, respectivamente.
A partir da criação da Embrapa, em 1973, foi criado um sistema de inovação da agropecuária, abrindo caminho para um setor ágil e empreendedor. Em menos de cinco décadas, o país saiu da insegurança para se tornar o maior celeiro de produção, e criou um modelo sustentável e competitivo de agricultura tropical sem paralelo com o mundo. Entre as principais mudanças, segundo Moretti, destacam-se o crescimento da produção de grãos em 509%, o aumento da produtividade do setor florestal em 140% e a alta de 65 vezes nos números da produção de carne de frango.
Soft power
No painel do presidente da Associação Nacional da Indústria da Música (Anafima), Daniel Neves, foi abordado o conceito de soft power. O termo é utilizado quando um país usa sua cultura ou economia para estimular a colaboração de outros países nas relações internacionais. Esse controle da imagem positiva torna os produtos e serviços produzidos internamente mais “simpáticos” à compra. Como exemplo, Neves citou a influência positiva do K-pop, gênero musical sul-coreano, sobre a imagem do país, principalmente para as novas gerações.
O Brasil sempre faz uso de programas para reerguer a imagem e retomar a um passado glorioso em algum âmbito, seja ele cultural, econômico, político, científico, etc. Já o lado estereotipado, que parte da impressão dos outros países, enxerga uma nação alegre, divertida e mágica, onde é carnaval o ano inteiro.
“O perigo, porém, é quando acontece o contrário do soft power e esse estereótipo é utilizado na guerra comercial. O mundo inteiro valoriza a floresta brasileira, mas o desmatamento e as queimadas são colocados como justificativas para atacar a imagem de potência agrícola e a um possível boicote na compra de soja e carne, por exemplo”, disse Neves.
O presidente executivo da AEB, José Augusto de Castro, encerrou o Enaserv lembrando que a exportação de serviços no Brasil é ainda muito pequena e que é necessário reduzir o custo Brasil para melhorar a competitividade das nossas exportadoras.
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